sábado, 8 de março de 2025

A chuva

 Gosto muito de chuva. 

É uma sensação de amor mais do que de ódio, na realidade, pois amo o cheiro das ervas molhadas, da maresia trazida pelo vento sul , das gaivotas em sobressalto, ansiosas por um alimento esquecido. 







Gosto dos reflexos das casas, das árvores e das silhuetas nos charcos junto às bermas dos passeios. Gosto da dança  dos chapéus de chuva na calçada.

Nunca vi chuva num país tropical, mas adoraria sair quase nua para os campos, abraça



ndo a água do céu feita louca.

Há alturas em que adoro contemplar as plantas depois da chuva, gratas e contentes, luminosas, e compensadas. 

Também gosto de abrir as persianas e ver as gotinhas de água a rolar pelo murete. 

Sou mais planta do que gente. Amo mais a Natureza do que as pessoas e os animais. É o silêncio delas que me fascina. Não falam,não exigem, não cansam, não poluem, limitam-se a dar o que têm e a prometer o que vão ter.

Como elas, gostaria de morrer de pé , com a certeza de que uns meses depois, outros botões brotariam, belos, prometedores e esperançosos. Que futuro risonho!



Só por isso valeria a pena viver num mundo sem palavras, feito de sons magníficos, imagens extraordinárias e paisagens transcendentes.

quarta-feira, 5 de março de 2025

Magnolias

 São as flores mais perfeitas que jamais vi, a par dos nenúfares e rosas. 





Todos os anos renascem a anunciar a Primavera, como vulcões adormecidos do seio dos troncos escuros. 

Silenciosas, salpicadas de gotas de orvalho, erguem-se para o céu em prece.

Enquanto puder admirar este milagre todos os anos, não preciso de mais. 

A Natureza dá -me todas as respostas de que necessito para continuar a acreditar na Vida. 

Não acredito em Deus. 

Não acredito em entidades sobrenaturais, que permitem o sofrimento atroz de crianças e pessoas desprotegidas, a destruição e derramamento de sangue. 

Mas estou grata por viver, porque faço parte da Natureza e nela me reconheço. 




segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Forever

 



Farias hoje 79 anos, se não tivesses partido há oito anos naquela manhã fria de Fevereiro. 

Escolheste o mês mais curto do ano para nascer e morrer. 

Mas hoje e aqui moras sempre comigo. Não há um dia em que não pense em ti, tal é a marca que deixaste em mim e nos teus filhos. A vida não voltou a ser a mesma.

Nesta foto tirada uma semana depois de nos conhecermos, transmites-me toda a paixão, sonho, ansiedade e juventude que havia em nós. Nada foi em vão. 

Obrigada, Manel!☀️

quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

Todos partem

  "Este parte, aquele parte e todos, todos se vão..."

Adriano canta sobre emigrantes, hoje eu celebro as minhas perdas.


Em três anos, perdi três irmãos, dois mais velhos, uma mais nova. As doenças mais ou menos genéticas levaram-nos após anos ou meses de sofrimento.

Diz-se que mais vale partir do que sofrer para inevitavelmente morrer. Penso que sim. Mas agarrados a Vida como somos , custa- nos admitir que tudo tem um fim.

A minha Irmã que nos deixou ontem era a Alegria em pessoa. Nunca quis casar, mas adorava crianças, dedicou toda a sua vida á Pediatria, como o nosso Pai. 

Os nossos Amigos e pacientes confiavam nela e viam nela mais que uma médica competente. 

A vida separou-nos, mas nunca perdemos contacto, pois ela era também a Madrinha do meu filho Zé. Neste Natal já não me telefonara a perguntar as medidas da camisola ou do casaco do afilhado. 😢.

A morte é algo misterioso. Custa a aceitar. Dói demais.

RIP, mana Isabel.


quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Back to memory lane

 Os ingleses usam esta expressão para indicar uma descida ao passado, um regresso ao que já foi, aos anos da nossa vida que já não voltam. Em geral, são momentos muito felizes, que gostamos de recordar. Mas também podem não ser, há crises que não saem da nossa memória e que nos fazem sofrer, mas não conseguimos esquecer.

Neste caso, trata -se de


relembrar dois anos bem destacados da minha vida em  que muito aconteceu, uma reviravolta total que me trouxe dois filhos e uma mudança radical.

Estava a viver no Porto em casa da minha sogra - situação sempre desagradável, sobretudo quando se não conhece a cidade, nem amigos, nem família do nosso lado.


Tinha saído de Lisboa em 1975, passado pela Sertã durante dois anos onde vivi em clausura, com breves visitas a Coimbra e Porto. O meu marido foi transferido para Esposende como interino. Ao fim de oito meses, colocaram no em Chaves, que era o cu de Judas. Não conhecia Trás-os-Montes e era a 500km de Lisboa onde tinha os meus Pais. O meu filho pequenino tinha desasseis meses.


Consegui colocação no Liceu de Chaves e mudamos em pleno inverno com neve e um frio de rachar para uma casa linda, mas sem aquecimento. Havia uma lareira que eu aproveitava bem quando tinha lenha.


Vivi dois anos e engravidei da minha filha com certos riscos pois Chaves não tinha serviço de ginecologia. Felizmente não tive problemas e fui fazendo as as análises prescritas.

Chaves era uma cidadezinha simpática com muitos


espanhóis, lojas, feiras, restaurantes óptimos e colegas com classe. Adorei o ambiente da Escola e os alunos, bastante respeitadores ainda que com dificuldades a inglês.

Aos fins de semana fazíamos a viagem ao Porto em 4 horas. Estradas horríveis, tempo horrível, gelo, frio. Não deixaram saudades, tanto mais que eu detestava a casa da minha sogra, e não me dava bem com ela .

Ontem fui aos sítios por


onde passei esses anos. O meu filho agora com 47 anos, ri-se quando recordo as suas tropelias. Todos gostavam dele, mas era difícil de domar. Não parava quieto nem um segundo. Até cantava a altos berros as canções da Eurovisão para os passantes da rua, que pediam bis.

Chaves mudou totalmente. Está uma cidade enorme com tudo o que é bom. Não me importava de viver lá uns meses, embora o mar me faça muita falta.


Foi fantástico revisitar o passado. Graças ao meu Filho, que se preocupa muito com o meu bem estar.

God bless him.

sábado, 9 de setembro de 2023

O jardim do Eden.










 Verão a morrer...sol brilhante, entre nuvens, Contrastes perfeitos para fotografia, depois da chuvada nocturna. Cheira a terra molhada, musgo humedecido, parreiras já amarelecidas, nenufares que ainda não imergiram...vozes de crianças que se confundem com o cacarejar dos galos. 

Já há alguns dias que não vinha aqui,mas agora vou ter de vir todos os dias,se não chover. É a única maneira de sobreviver. I learned that by myself.

Recebi o resultado das análises e TACS ontem. Aparentemente não ha nada suspeito excepto uns ganglios pequeninos no abdomen. Vou fazer um Pet aqui a 15 dias para saber o que fazer em caso de perigo cancerigeno. Ando com dores no corpo, que me impedem de ir a piscina e andar a pe. Isso enerva me.

Ha quase um ano que isto comecou. Sobrevivi e consegui ultrapassar os obstaculos. Estou mais triste e desanimada, mas os meus estao bem e isso é que interessa. 

domingo, 6 de agosto de 2023

Um por todos

Este Encontro prova que muitos jovens têm carências e vontade de transformar o que está mal.






Querem convencer os adultos, os políticos, os decisores, os pais e educadores a mudar de rumo.
O Homem precisa de esperança, de acreditar em si e nas suas capacidades, no seu empenho, na sua generosidade. 
A Religião pode ser diversa, não tem de ser católica, é uma convicção e uma necessidade de fazer o Bem, de melhorar o mundo, de proteger a Terra, de amar o próximo.
Isso é Religião. Não é só catolicismo ou cristianismo. Há muitas mais pessoas, não apenas um milhão, que querem transformar as sociedades , substituir os milionários pelos pobres, redistribuir riqueza, dar a quem nada tem meios de sobrevivência. Se cada um der 1€  já dá para fazer alguma coisa. 
Não é Cristo que nos manda dar. Somos nós os donos das nossas posses e qualidades .
 Não precisamos de acreditar nos dogmas da Igreja, nem de seguidismos em rebanho. 
Não somos um povo escolhido e privilegiado. Somos todos iguais.
Acreditemos em nós, Homens, para viver uma Vida digna e fiel a nós próprios. 

As pessoas melhores que conheci não eram católicas. Acreditar ajuda a ter força. 
Mais coragem é precisa para quem só acredita na Humanidade e nas suas capacidades.

sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Young forever


 Dá a impressão de que o mundo parou desde que começaram as jornadas da. Juventde.

 Não se fala de políticas, nem de problemas sindicais, nem de greves. 

Será que, na 2 feira, recomeça tudo á batatada ou vamos todos orar para os campos do Alentejo? 

O país precisa de trabalho,proatividade. Sermos tão passivos é que nos tem levado á letargia e estagnação.

 Jane Goodall diz que a esperança é fazer com que as coisas mudem por nosso motu próprio . Acredito nisso. Não e Deus quem vai preservar a Terra, somos nós com mudanças de hábitos e menos apego aos bens materiais. 

Orar só não transforma nada. Pedir é poucoxinho quando nada se dá.

Criar, inventar,  modificar,  é a única via para o progresso. Amém.

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No Botânico:






Há anos que venho para aqui. Há 17, precisamente. 

Desde então, já me morreram  pessoas mais novas e mais velhas  da família. Pais, irmãos, ex- marido, sobrinhos ,etc . Foi uma perda enorme que me levou a pensar na morte mais a sério.



Custa- me a acreditar que todas estas pessoas tão importantes na minha  vida desapareceram num espaco de tempo diminuto. Sobretudo os meus irmãos,  que eu julgava imortais.

Venho aqui homenagea-los, lembrar- me deles, pensar no passado e nas alegrias que me deram. Fazem me falta como referência. Este jardim é como um epitáfio. Gostaria que as minhas cinzas fossem depostas aqui.

Ninguém é  mais velho que eu aqui no Porto. Serei a decana enquanto durar, a Avó, a Mãe, a Tia, a Madrinha, a conselheira. Mas tambem serei a que menos conta no decorrer da espuma dos dias. Já vivi muito.

Tenho cancro. Luto ha meses para o debelar. Desde  que  o detectaram, enchi me de coragem e adrenalina para dar a volta por cima e há dias em que me sinto mesmo bem.

Custa me concebe-lo. Não acredito. Creio na Ciência e no corpo humano. E na minha força de vontade.

Sinto me ainda tão jovem, tão capaz de criar, de vencer, de me transformar...queria viver mais. uns anos, ver bisnetos, viajar ...


Mas se o Paraíso for assim, como este Jardim maravilhoso, não me importo de morrer.

segunda-feira, 31 de julho de 2023

O show da Juventude 1963/2023


https://www.freguesiadeguisande.com/2021/12/grandeencontro-da-juventude-abril-de.html

1963

Participei activamente neste evento.  E fácil ver a mentalidade retrógrada dos objectivos que o regeram.

60 anos depois mudei muito a minha opinião sobre a Igreja e a religião católica. Penso que se está a lavar o cérebro dos jovens através da mediatização, do discurso repetitivo, da emoção e até do uso da música. 

Sei o que é. Vivi o na minha adolescência. É giro enquanto dura porque nos empenhamos em algo de bom, colectivamente. Achamos que ser bom é tomar parte em grandes manifestações e festivais, beber e cantar, como se a vida fosse cor de rosa. Só falta irmos todos ver a Barbie com o Papa.

Mas em grande parte, tudo isto é hipócrita e falso, um show off, ostentatorio do poder da Igreja Católica , incensando um homem como todos os outros, com qualidades defeitos,incapaz de mudar o mundo por muito bem que fale e por muitas viagens que faça.

Este poema derrama agua fria neste fogo fatuo.

Poesias

Como se morre de velhice

ou de acidente ou de doença,

morro, Senhor, de indiferença.


Da indiferença deste mundo

onde o que se sente e se pensa

não tem eco, na ausência imensa.


Na ausência, areia movediça

onde se escreve igual sentença

para o que é vencido e o que vença.


Salva-me, Senhor, do horizonte

sem estímulo ou recompensa

onde o amor equivale à ofensa.


De boca amarga e de alma triste

sinto a minha própria presença

num céu de loucura suspensa.


(Já não se morre de velhice

nem de acidente nem de doença,

mas, Senhor, só de indiferença.)


Cecília Meireles


in 'Poemas (1957)'


Saudemos os povos de outras religiões num abraço colectivo e num desejo verdadeiro de união e ajuda mútua. 

Sejamos honestos, proactivos, criadores dum mundo melhor. 

Sem sectarismos .



domingo, 30 de julho de 2023

Sem amanhã

 Acordo sem vontade de me levantar, viver, comunicar. 

Acordo com vontade de continuar a dormir, embrulhada no edredom, acariciando a almofada, no quarto escuro como breu, ignorando o relógio, esquecida das horas, dos outros, do sol lá fora, das flores e da beleza das árvores. Acordo sem vontade de pintar, com asco aos pincéis, às tintas, aos papéis, ao atelier. Acordo sem apetite para nada, ciente de que não vou ver o meu filho mais novo até 6 feira, apesar de serem férias, ciente de que vou estar o mês quase todo sem o resto da família que vai viajar, sem poder ir a praia por falta de forças, farta da monotonia destes dias de verão. 

Acordo com a certeza de que a quimio me vai piorar a neuropatia dos meus pés, o ardor dos lábios e o enjoo habitual se não trouxer outros efeitos piores.



Acordo com vontade de fechar a cortina da vida, acabar já com tudo. 

Sem planos. 

Sem looking forward to. Sem sonhos. Sonhar em quê?

 

Estas JMJ deprimem me. Fogo fátuo. Daqui a 50 anos todos estes jovens serão burgueses instalados, nem á Missa irão. Uma percentagem ter-se á dedicado a causas, mas o mundo cada vez está pior e são gotas de água no oceano.

Não acredito em mais nada, não é o Papa que vai mudar o mundo. Esta adoração duma pessoa irrita me como aos protestantes e outros crentes em religiões onde não há Papas. Ninguém é dono da Igreja. Ninguém tem o direito de gerir os milhões que lhes oferecem. Ninguém é sagrado. E muito menos santo.

Só a Ciência modifica o estado das coisas. Só a Ciência transforma e cura. 

Amo os laboratórios, os frascos, as amostras, as pipetas. Só eles me manterão viva. Confio na minha médica, mas ela não faz milagres.


Amanhã poderei estar viva e optimista. 

Se eu quiser.